Este é um grupo de doenças que tem como denominador comum uma inflamação. Os fármacos são a única arma contra esta ameaça à perda de visão, mas a eficácia do tratamento continua dependente do melhor diagnóstico. Atualmente, controlar a uveíte é o derradeiro objetivo, mas a tarefa pode demorar meses ou anos

A uveíte é uma situação clínica potencialmente ameaçadora da visão. No entanto, a evolução dos fármacos anti-inflamatórios e imunomoduladores permite hoje um controlo da inflamação intraocular com uma eficácia e segurança apreciáveis. Os resultados dependem de muitos fatores, sendo dos mais importantes um diagnóstico preciso e um tratamento atempado de uma uveíte. Antes de uma decisão terapêutica é necessário uma história clínica detalhada, um exame oftalmológico completo e exames complementares de diagnóstico para determinar uma eventual causa. O controlo do processo inflamatório pode demorar meses ou inclusivamente vários anos, dependendo da sua causa.

O que é uma uveíte?

Uveíte é um termo genérico para descrever um grupo de doenças em que há uma inflamação intraocular, podendo o processo inflamatório causar uma destruição de tecidos e uma perda de visão mais ou menos grave. O termo uveíte deriva da palavra “úvea”, que é a camada vascular do globo ocular, embora numa uveíte o processo inflamatório não se limite a esta estrutura e possa afetar o cristalino, a retina, o nervo ótico e o vítreo, reduzindo a visão, ou causando mesmo cegueira. As uveítes têm muitas e diferentes causas, podendo ser doenças que afetam exclusivamente o globo ocular ou serem, tão só, uma manifestação ocular de uma doença sistémica, afetando outras partes do corpo. Podem ocorrer em qualquer idade, inclusivamente em crianças. Podem ser agudas (meses) ou crónicas (anos) e, algumas formas de uveíte podem manifestar-se por crises recorrentes de inflamação intraocular, que acontecem a intervalos irregulares, podendo cada episódio deixar sequelas no globo ocular e, consequentemente, na visão.

O que causa a uveíte?

A uveíte é causada por uma resposta inflamatória dentro do globo ocular, sendo a inflamação uma reação do organismo a lesões dos tecidos, a micro organismos ou a toxinas. A inflamação causa edema, hiperémia, calor e destruição dos tecidos, pela libertação de mediadores inflamatórios por células (leucócitos), que são atraídos ao local da inflamação, numa tentativa de conter ou eliminar a agressão. Uma uveíte pode ser causada por:

• Um ataque do próprio sistema imune (autoimunidade);

• Infeções dentro do globo ocular ou noutras partes do organismo;

• Traumatismos;

• Toxinas que penetram no globo ocular.

No entanto, e apesar dos estudos, em muitos casos (cerca de 50%) a causa é desconhecida.

A uveíte pode causar sintomas como olho vermelho, dor ocular, fotofobia, visão enevoada ou grande baixa de visão, embora estes dependam da localização do processo inflamatório dentro do globo ocular. Do ponto de vista clínico, os oftalmologistas sistematizam este conjunto de doenças, quer de acordo com a sua causa, em infeciosa e não infeciosa, quer de acordo com a localização da inflamação no globo ocular, em:

• Uveíte anterior;

• Uveíte intermédia;

• Uveíte posterior;

• Panuveíte.

O que é uma uveíte anterior?

Denomina-se uveíte anterior a inflamação do segmento anterior do globo ocular. É a forma mais comum de uveíte e afeta sobretudo pessoas jovens e de meia-idade. Muitos casos acontecem em pessoas saudáveis, sem nenhuma outra doença, mas alguns estão associados a doenças reumatismais, pulmonares, da pele, gastrointestinais ou infeciosas. Manifesta-se principalmente por um quadro de olho vermelho, sempre associado com dor.

O que é uma uveíte intermédia?

É frequentemente observada em adultos jovens e o local da inflamação é a pars plana e o vítreo. Pode estar associada a várias doenças, incluindo a sarcoidose e a esclerose múltipla. Embora possam causar olho vermelho e dor, manifesta-se principalmente por baixa de visão.

O que é uma uveíte posterior?

Na uveíte posterior a inflamação ocorre no segmento posterior do globo ocular, podendo envolver a retina, a coroideia, os vasos da retina (vasculite) e o nervo ótico. É muitas vezes designada coroidite, retinite ou coriorretinite. Existem múltiplas causas infeciosas e não-infeciosas que causam uveíte posterior, sendo necessário, por vezes, um estudo sistémico exaustivo para tentar excluir uma causa sistémica. Geralmente não se manifesta por olho vermelho ou dor ocular, e apenas causa uma baixa visão, mais ou menos grave.

O que é uma panuveíte?

É o termo utilizado quando a maior parte das estruturas oculares é afetada pela inflamação. A sarcoidose, a doença de Behçet e a uveíte simpática são causas bem conhecidas de panuveíte e que podem causar lesões significativas da retina. Pode manifestar-se por olho vermelho com dor e baixa de visão.

As uveítes intermédias, posterior e panuveíte, são as formas mais graves e recorrentes de uveíte e podem causar cegueira, se evoluírem sem tratamento adequado.

Como é tratada a uveíte?

Os princípios gerais do tratamento são eliminar a inflamação, aliviar os sintomas, recuperar a visão e prevenir futuras crises, se possível. O tratamento depende da causa subjacente e do tipo de uveíte. O tratamento standard são os corticosteroides, quer aplicados em forma de gotas (nas uveítes anteriores), em injeções peri ou intraoculares ou por via sistémica (uveítes intermédia, posterior ou panuveítes), especialmente se atingem os dois olhos.

Os corticosteroides orais têm efeitos secundários importantes se utilizados durante muito tempo (úlceras gástricas, osteoporose, diabetes, ganho de peso, catarata, glaucoma e síndroma de Cushing). Quando se prevê que a sua utilização ultrapasse três meses, geralmente são utilizados agentes imunomoduladores no tratamento das uveítes não anteriores.

Os agentes imunomoduladores frequentemente utilizados incluem a azatioprina, o micofenolato, o metotrexato e a ciclosporina A. Estas medicações requerem análises sanguíneas periódicas para excluir possíveis efeitos secundários. Nalguns casos, resistentes a estas terapêuticas, pode ser necessário recorrer a agentes modificadores da resposta biológica, comumente designados agentes biológicos, como o adalimumab, infliximab ou rituximab. Estes fármacos têm como alvo elementos específicos do sistema imunológico.

Que investigação está a ser realizada nas uveítes?

Existem inúmeros estudos básicos e clínicos a decorrer sobre uveítes, que irão permitir melhorar a deteção, tratamento e prevenção desta doença:

• Novos métodos de tratamento;

• Investigação de possíveis causas de uveíte;

• Deteção de pessoas suscetíveis a desenvolver uveíte.

Rui Proença

(médico oftalmologista)

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