O que têm em comum Hannibal, Anders Breivik, alguns personagens da série Guerra dos Tronos e outros tantos políticos mundiais? São psicopatas. E sim, o cérebro deles é diferente. Podem ser perigosos, são maus a tomar decisões e podem ocupar lugares de liderança

A psicopatia, sociopatia ou perturbação de personalidade antissocial é considerada uma categoria diagnóstica, e atinge cerca de 1% da população. Apesar de a psicopatia ser inata, parece também existir uma correlação entre eventos negativos na infância (0 aos 4 anos) e aspetos emocionais da psicopatia. Os psicopatas, habitualmente do sexo masculino, são conhecidos pelo seu egoísmo, indiferença afetiva e comportamento violento – assassinato, violação ou assalto violento.

Os psicopatas apresentam 3 caraterísticas: o atrevimento (ausência de medo, baixa tolerância ao stress, elevada autoconfiança e assertividade social), a desinibição (baixo controlo do impulso, incluindo dificuldade de planeamento e previsão, ausência de afeto, necessidade de gratificação imediata, dificuldade no controlo comportamental) e a mesquinhez (falta de empatia, falta de ligação emocional aos outros, desdém pelas ligações emocionais fortes, utilização da crueldade para ganhar poder, explosividade, desafio da autoridade e busca de emoções destrutivas).

O filme Hannibal retrata um psicopata, enquanto na realidade Ted Bundy, licenciado em Direto e em Psicologia, um assassino em série, foi o exemplo de que na sociedade os psicopatas estão entre nós!

Diferenças no cérebro dos psicopatas

Neurocientistas que realizaram ressonância magnética funcional (fMRI) e estrutural em psicopatas demonstraram que existem alterações estruturais no cérebro. Os psicopatas mostram prejuízo no sistema de neurónios em espelho, sistema esse que, no cérebro saudável, é responsável pela empatia, e fica ativo quando executamos uma ação, ou quando percebemos que outra pessoa fez a mesma ação que nós.

No Reino Unido, um estudo com psicopatas na prisão, mostrava que estes quando expostos a situações dolorosas, não ativavam na fMRI as áreas do cérebro dedicadas ao processamento emocional e à empatia pela dor. Estas áreas são: insula anterior, córtex cingulado anterior, córtex somatossensorial e amígdala direita. Neste estudo, mesmo quando se pediu aos indivíduos para imaginarem alguém a sentir dor, as mesmas áreas do cérebro falhavam em responder, e não ficavam ativadas.

Outro estudo realizado na Universidade de Winsconsin-Madison, nos EUA, avaliou com fMRI o cérebro de psicopatas na prisão. A ressonância mostra que nos psicopatas se verifica uma redução das conexões entre o córtex pré-frontal ventro-medial (responsável pela empatia e culpa) e a amígdala (a parte do cérebro que medeia a ansiedade e o medo). Neste estudo foi também realizado um tipo especial de ressonância magnética, designada de imagem por tensor de difusão (DTI), que é utilizada para mapear a tractografia da substância branca no cérebro. Esta ressonância por DTI mostra uma redução da integridade na substância branca que conecta as duas áreas. Assim, estas duas estruturas cerebrais, que regulam as emoções e o comportamento social, parecem não comunicar como deveriam, podendo estes resultados ajudar a explicar o comportamento impulsivo e insensível, exibido por alguns psicopatas.

Outro estudo, na Universidade de Radboud, na Holanda, atribuiu à testosterona um papel na redução da conectividade entre o córtex pré-frontal e a amígdala, apresentando o excesso de testosterona como hipótese para explicar a maior prevalência de psicopatia nos homens.

O estudo realizado por Nigel Blackwood no King’s College em Inglaterra, confirmou que psicopatas na prisão apresentavam uma redução do volume da substância cinzenta no córtex pré-frontal ventro-medial (área do cérebro envolvida na tomada de decisão empática, que nos ajuda a decidir entre beneficiar o outro ou a nós mesmos).

“Coração frio”

Este estudo, mostra que psicopatas apresentam menor substância cinzenta nas áreas importantes para o reconhecimento das emoções e intenções dos outros, e que são ativadas quando as pessoas pensam sobre o comportamento moral. Assim, a lesão nestas áreas, associa-se a falta de empatia, baixa resposta ao medo e falta de emoções, como a culpa ou o embaraço. O estudo de Blackwood diferencia os indivíduos designados de ‘cabeça quente’ (não psicopatas) que reagem de forma agressiva à frustração ou à perceção de ameaça; e os psicopatas designados de ‘coração frio’, que manifestam comportamento agressivo, ofensas à integridade física desde tenra idade, executam maus tratos a animais durante a infância e mostram fraca resposta aos programas de tratamento.

A relação entre justiça e psicopatia está também presente na atualidade, quando em 2011, o norueguês Anders Breivik, um psicopata que assassinou 77 pessoas e feriu 51, foi condenado à pena máxima de prisão, apesar de ter sido equacionado o diagnóstico de psicose, para lhe reduzir a pena a cumprir.

Em conclusão, reconhecer as alterações na estrutura e funcionamento do cérebro características dos psicopatas, terá implicações no tratamento dos indivíduos que cometem crimes, sendo importante diferenciar os psicopatas que, apesar de terem pior prognóstico, beneficiam de programas de tratamento específicos.

Também a nível judicial, identificar os psicopatas terá consequências, em que estes, denominados de ‘coração frio’, serão responsabilizados pelos seus crimes, enquanto os que cometeram um crime no decorrer de uma doença psiquiátrica como a psicose, serão considerados inimputáveis e cumprirão uma medida de segurança.

Sofia Morais
(Médica, Psiquiatra)

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