É uma doença, mas só é confirmada depois das inúmeras tentativas para engravidar não terem sucesso ao fim de 12 meses. A reprodução está comprometida,mas há quem ajude a inverter este destino. As técnicas de procriação medicamente assistida podem recuperar o voo de cegonha com entrega cancelada. A unidade do Centro Cirúrgico de Coimbra atingiu uma taxa de gravidez de 45%. Há várias histórias que acabam com um final feliz

No último ano, acentuou-se o que já era uma tendência de há 30 anos, o número de nascimentos tem vindo a diminuir. A queda do número de nascimento de bebés nem sempre resulta de uma opção voluntária. Em Portugal, há 10 mil novos casos de infertilidade todos os anos. É uma doença. Não manifesta dor física e os sintomas não são visíveis, mas o diagnóstico acaba por chegar ao fim de 12 meses de ausência de gravidez.

Definida como uma doença e considerada como um problema grave de saúde pública, a infertilidade pode ser estudada e as causas podem ser identificadas. Às vezes, há histórias que acabam com um final feliz. Em 90 a 95% dos casos é possível chegar a um diagnóstico e a uma proposta de solução. Sabe-se que a incidência e a prevalência têm vindo a aumentar em todos os países ocidentais, porque adiamos a maternidade (à espera do momento ideal), estamos mais sedentários, há mais obesidade, consumimos álcool e tabaco, há mais poluição e está a aumentar a prevalência das infeções de transmissão sexual.

Tudo ingredientes que, juntos, ou isoladamente, acabam por provocar uma falência orgânica que se traduz em infertilidade. A capacidade inata para produzir vida fica comprometida. Sentimo-nos diferentes. Vazios e sem rumo. O bem-estar pessoal e familiar corre o risco de ser afetado. O estudo completo dos casais doentes permite quantificar as causas da infertilidade, que podem ter origem feminina (30%), masculina (30%), em ambos (30%) ou de causa desconhecida (10%). Em alguns casos, basta uma simples terapêutica médica, como a indução da ovulação, a correção de distúrbios hormonais ou o tratamento de uma infeção para que o problema seja corrigido.

Noutros casos, pode ser preciso realizar uma intervenção cirúrgica (por via endoscópica ou convencional) ou recorrer às chamadas técnicas de Procriação Medicamente Assistida (PMA).A inseminação intra-uterina é a mais simples das técnicas de PMA e consiste na colocação de esperma tratado diretamente no interior da cavidade uterina. É uma técnica simples, rápida e praticamente indolor realizada no gabinete de consulta.

As principais indicações para a sua utilização são a existência de fator cervical (incompatibilidade entre o muco do colo do útero e os espermatozoides), a presença de uma alteração ligeira da qualidade do esperma ou uma infertilidade de causa desconhecida. Esta técnica apresenta uma taxa de gravidez de 15% em um ciclo e uma taxa cumulativa de 50 a 60% de sucesso após três ciclos.

A Fertilização in vitro (FIV) também pertence ao grupo de técnicas PMA e consiste na união (em laboratório) dos gâmetas feminino e masculino. Ou seja, os óvulos são colocados juntamente com os espermatozoides em meios de cultura adequados e a fecundação ocorre espontaneamente. A principal indicação para realizar esta técnica é a presença de um fator tubar (alteração da função e/ou permeabilidade das trompas), mas também pode ser um recurso para situações de anovulação, infertilidade sem causa conhecida, por fator masculino ligeiro, por fator endometriose e fator cervical.

Por fim, deveremos ainda incluir nas técnicas de PMA a Microinjeção do Espermatozoide no Óvulo (ICSI), que tem como objetivo facilitar a fecundação através da redução ou eliminação dos obstáculos que os espermatozoides encontram na sua tentativa de penetrar no óvulo e de conseguir fecundá-lo. A técnica resume-se a uma microinjeção direta de um espermatozoide no interior do ovócito e é reservada para casos em que se prevê insucesso de fecundação em FIV, contribuindo para a resolução de muitos casos de esterilidade masculina grave.

A ICSI apresenta uma taxa média de gravidez de 28,5% (por punção) e de 33% (por transferência embrionária). No Centro Cirúrgico de Coimbra a unidade de Medicina da Reprodução (Clinimer) proporciona o estudo completo do casal infértil, bem como todos os tratamentos referidos. Existe ainda a possibilidade de criopreservação de embriões excedentários de boa qualidade, de modo a poderem ser utilizados em ciclos posteriores, sem necessidade de se recorrer a tratamentos indutores da ovulação e a nova punção folicular.

Se, por razão médica, for necessário recorrer a esperma de dador, esta unidade utiliza amostras provenientes de um banco de esperma espanhol, devidamente credenciado e autorizado pelo Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida. De sublinhar que os bancos de esperma realizam uma minuciosa seleção dos possíveis dadores, realizando (sistematicamente) o estudo genético e de doenças infeciosas de todos os dadores (Hepatite B e C, SIDA, Sífilis, etc..).

Para estes casos é ainda possível ter em conta outros fatores, como o grupo de sangue e as características físicas do casal recetor (estatura, cor dos olhos e do cabelo). Contudo, a origem e o destino das amostras de esperma são mantidos sob rigoroso anonimato, de acordo com o que está previsto na legislação portuguesa. A unidade de Medicina da Reprodução do Centro Cirúrgico de Coimbra está certificada pela Norma Europeia de Qualidade, pelo que está sujeita a várias auditorias.

A última auditoria realizada em Outubro de 2012 constatou a existência de uma taxa de gravidez da ordem dos 45%, no conjunto dos ciclos de Fertilização in vitro e Microinjeção do Espermatozoide no Óvulo.

Margarida Silvestre
(Médica ginecologista-obstetra)

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