Um corrimento pelos mamilos pode ser inofensivo ou pode significar uma situação preocupante, exigindo uma investigação com recurso a exames complementares. A ressonância magnética é o exame imagiológico que contribui de forma mais precisa e eficaz para a determinação da causa de alguns corrimentos mamilares, quer de origem cerebral, quer de origem mamária

Corrimentos mamilares referem-se à secreção que pode ser observada a partir dos mamilos, sendo um fenómeno que pode ocorrer de forma espontânea ou provocada através da expressão do mamilo. Na grande maioria dos casos trata-se de secreções mamilares inofensivas; no entanto, a presença de corrimento mamilar pode suscitar preocupações significativas, especialmente se ocorrer de forma espontânea, em quantidades excessivas ou se apresentar características atípicas, nomeadamente a cor ou a associação a outros sinais e sintomas.

Gravidez e amamentação

Durante a gravidez e lactação é comum as mulheres apresentarem corrimentos mamilares. O colostro, por exemplo, é uma secreção normal que pode ser observada nos estágios finais da gestação. Durante a amamentação, o colostro dá – geralmente – lugar ao leite materno que, em circunstâncias normais, tem uma espessura e coloração típicas e é bilateral e multiporo, ou seja, é expulso pelas duas mamas e por todos os poros de cada um dos mamilos.

Os corrimentos mamilares patológicos podem ter características sobreponíveis aos corrimentos fisiológicos (leite) ou, ao contrário, características específicas acompanhadas ou não por alterações das mamas ou sinais e sintomas gerais.

Adenoma da hipófise

Os adenomas ou, mais frequentemente, os microadenomas da hipófise são responsáveis pela produção exagerada de uma hormona, a prolactina, que é a hormona que induz a produção láctea que também se verifica na gravidez e na lactação. No entanto, perante um corrimento lácteo, mesmo que pouco abundante ou apenas visível após expressão dos mamilos, bilateral e multiporo numa mulher não grávida e não lactante de qualquer idade, desde a infância até idades muito avançadas, deveremos procurar uma patologia cerebral, nomeadamente através de ressonância magnética craneo-encefálica ou, especificamente, da hipófise, no sentido de eliminar a possibilidade de tumor cerebral hipofisário. No caso de se verificar um tumor da hipófise, o tratamento médico deverá ser imediatamente instituído, sendo muito raros os casos que necessitam de neurocirurgia e ainda mais raros os casos em que se verifica a existência de tumores malignos.

A hiperprolactinemia, ou seja, o excesso desta hormona produzida no cérebro, além de causar corrimento mamilar lácteo, pode ser causa de infertilidade e de alterações do sistema nervoso central como cefaleias ou vómitos, entre outras.

Mastites e abcessos mamários

As mastites (infeções mamárias) ou, em casos mais graves, os abcessos mamários são mais frequentes durante a amamentação, mas podem ocorrer em qualquer idade desde o recém-nascido até à velhice. São infeções bacterianas, frequentemente acompanhadas ou precedidas de corrimento mamilar unilateral, no caso de mastite unilateral, ou bilateral, se ambas as mamas estiverem infetadas. Nestes casos o corrimento mamilar tem um aspeto purulento, amarelo ou esverdeado, geralmente mais espesso e acompanha-se de sinais inflamatórios mais ou menos exuberantes de uma ou ambas as mamas, frequentemente com dor intensa (mastalgia), edema, calor e rubor (pele vermelha, quente e brilhante). Não é raro a axila homolateral ou ambas as axilas, no caso de mastite bilateral, apresentarem gânglios aumentados de volume e igualmente dolorosos. Pode ocorrer febre e arrepios, com mau estar geral.

Também nestes casos se deve instituir de imediato terapêutica médica com antibiótico, anti-inflamatório e analgésicos, no caso de não estar formado um abcesso. Se se verificar evolução da infeção com a terapêutica instituída e a formação de abcesso mamário, a doente deverá ser submetida a drenagem cirúrgica, preferencialmente com excisão de tecidos não necrosados adjacentes, para eliminar a possibilidade de tumor maligno e para diminuir a possibilidade de recidiva.

Quistos mamários e ectasias ductais

Os quistos mamários em continuidade com os ductos ou canais mamários podem drenar o líquido que contêm para o interior dos respetivos ductos e, de forma espontânea ou provocada pela expressão mamilar, drenar este conteúdo para o exterior através do mamilo. O mesmo se passa quando os canais intra-mamários estão muito dilatados, com o seu diâmetro muito aumentado, o que ocorre geralmente após amamentações muito prolongadas ou arrastadas.

Em ambas as situações, o corrimento mamilar pode ser uni ou bilateral e desperta alguma ansiedade no médico, já que não é possível eliminar a possibilidade de tumor maligno, particularmente quando simultaneamente se palpa um ou mais nódulos, por vezes duros e fixos, que podem corresponder aos referidos quistos ou a situações mais graves. O corrimento é, habitualmente, amarelado ou citrino, por vezes mais esverdeado, podendo ser líquido ou mais espesso, pode ter um odor desagradável por retenção prolongada nos canais galactóforos.

O exame imagiológico mamário é sempre necessário. A ecografia mamária pode indicar a presença de quistos ou de ectasias ductais mas, por vezes, é necessária a realização de ressonância magnética mamária para eliminar a possibilidade de tumor, nomeadamente nas situações em que o corrimento é unilateral e uniporo.

Papilomas intra-ductais

Os papilomas intra-ductais são lesões tumorais benignas, parecidas com pólipos, que crescem dentro dos ductos mamários. A maioria das vezes acompanham-se de corrimento mamilar líquido, raramente espesso, esbranquiçado ou transparente ou ligeiramente rosado, raramente sanguinolento. Este corrimento obriga ao diagnóstico diferencial urgente com carcinoma maligno da mama (intra-ductal), já que se apresenta da mesma forma, ou seja, unilateral e, geralmente, uniporo, quando apenas um ducto está envolvido. Nos casos de papilomas múltiplos, ou seja, disseminados num ou mais ductos, é considerada uma situação pré-maligna, com grande potencial de se transformar em cancro e obriga a tratamento urgente, sendo uma excelente oportunidade de prevenir o cancro da mama.

Estas situações carecem de diagnóstico rápido, particularmente nos casos em que o corrimento é transparente ou sanguinolento, através de um exame chamado galactografia que consiste na introdução de um produto de contraste no poro por onde se exterioriza o corrimento seguido de radiografia (mamografia) daquela mama. Atualmente, sempre que possível é desejável optar pela ressonância magnética mamária que, além de nos dar um diagnóstico com maior precisão, é mais confortável para a doente, já que a galactografia é um exame doloroso e muito moroso.

Cancro da mama

Nem sempre os corrimentos mamilares são normais e inofensivos. Infelizmente, a primeira manifestação de um cancro da mama pode ser um corrimento mamilar. Nestes casos é frequente tratar-se de um corrimento líquido, espontâneo, unilateral e uni ou biporo. Estes corrimentos tendem a ser sanguinolentos, acastanhados, rosados ou alaranjados, frequentemente vermelho-vivo. No entanto, não é raro um cancro da mama intra-ductal, ou seja, que se localiza dentro dos ductos ou canais galactóforos, manifestar-se por um corrimento de aspeto inocente, líquido, transparente, tipo “água de rocha”, sem quaisquer outros sinais ou sintomas acompanhantes, não sendo obrigatório palpar-se um nódulo ou encontrar algo de anormal na mama ou axila. Estes são os cancros da mama que, na maioria das vezes são curáveis, não necessitando de tratamentos agressivos, raramente metastizam e são chamados “Carcinomas ductais in situ”.

Sempre que estamos perante um corrimento mamilar com estas características, mesmo sem qualquer outra alteração da mama, deveremos optar de imediato pelo diagnóstico imagiológico que deverá incluir a mamografia, ecografia mamária e ressonância magnética mamária com biópsia de qualquer lesão visível num destes exames.

Embora o corrimento mamilar possa ser considerado inofensivo e natural, experienciado pelas mulheres grávidas e em período de amamentação, é essencial avaliar as suas características e qualquer sinal ou sintoma que possa indicar a existência de uma condição subjacente mais grave. O acompanhamento médico consciente e responsável é a melhor forma de garantir a saúde mamária e de eliminar a possibilidade de condições patológicas benignas ou malignas. O diagnóstico imagiológico configura a boa prática médica nas situações não fisiológicas e deve ser célere. O tratamento deverá ser instituído o mais brevemente possível, quando estamos perante situações patológicas malignas ou que têm elevado potencial de transformação neoplásica.

Margarida Figueiredo Dias
(Médica, Ginecologista)

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