A pressão exercida pelas expetativas externas pode encaminhar as pessoas mais tímidas para uma luta contra si próprias e contra as suas características. Na tentativa de serem o que é esperado delas, estas pessoas podem desvalorizar a sua unicidade bastante valiosa num mundo cada vez mais ruidoso

Olhar para a timidez como uma característica que todos podemos experimentar em maior ou menor grau, conforme o momento que vivemos, a estrutura da nossa personalidade e o nosso funcionamento, permite afastá-la de definições patológicas. 

Na verdade, a timidez é bastante comum, existindo em pessoas de diferentes idades e em diferentes culturas. Contudo, quando a timidez é intensa e inibe o acesso a oportunidades, prejudica relacionamentos ou cria sofrimento, ela pode evoluir para situações mais preocupantes e que podem pôr em causa o bem-estar emocional e a saúde do individuo, podendo mesmo chegar ao transtorno de ansiedade social. Nestas situações procurar ajuda profissional será fundamental, na medida em que poderá permitir encontrar instrumentos internos e desenvolver estratégias para enfrentar dificuldades, de forma a ser capaz de valorizar a individualidade e o crescimento pessoal. 

Assim, embora algumas pessoas tímidas sejam apenas mais reservadas, outras podem sentir ansiedade significativa em momentos que exigem determinadas formas de interação social, como por exemplo, falar em público ou conhecer pessoas. Muitas vezes, quem é tímido receia o julgamento ou a rejeição, o que pode levar ao evitamento de certas situações. 

Numa sociedade que recompensa a desinibição, as pessoas tímidas enfrentam muitas vezes desafios ímpares. Ser tímido pode parecer uma barreira e muitos ambientes sociais, como por exemplo a escola e o mercado de trabalho, continuam a privilegiar quem se destaca nas interações sociais. Esta realidade pode causar um sentimento de falta de pertença e ser geradora de insegurança ou de sensação de marginalização. A expetativa constante de interação pode ser exaustiva para quem é mais tímido e pode precisar de mais tempo para se sentir confortável em certos ambientes.

A pressão exercida pelas expetativas externas pode encaminhar as pessoas mais tímidas para uma luta contra si próprias e contra as suas características. Na tentativa de serem o que é esperado delas, estas pessoas podem desvalorizar a sua unicidade que se destaca por ser bastante valiosa num mundo cada vez mais ruidoso. Geralmente reconhecem-se nos indivíduos mais tímidos qualidades de bons ouvintes, grandes observadores e pensadores profundos, o que os torna excelentes em papéis que exigem empatia e espírito criativo. Numa sociedade que sobrevive ao som de ritmos acelerados e, muitas vezes, mais superficiais, esta postura de qualidade mais introspetiva pode ser um contributo essencial. Muitos tímidos encontram o seu lugar em ambientes que valorizam a profundidade em vez da quantidade de interações. 

Talvez as pessoas tímidas só não gostem de holofotes e da ribalta. A sua timidez acaba por funcionar também como mecanismo de regulação, capaz de proteger o indivíduo de momentos menos confortáveis.

Tímidos e não tímidos podem conviver de forma harmoniosa. Temos de ter a capacidade de perceber que nem todos precisam de ser expansivos e efusivos para participar em sociedades produtivas do ponto de vista relacional. As conclusões que surgem quando pensamos sobre a diferença e a diversidade tornam-se tão mais importantes quanto mais as sociedades reconhecem o valor de diferentes tipos de personalidades, incluindo as mais reservadas, que podem encontrar métodos de expressar o seu potencial de forma verdadeira, sem ceder a pressões para que se encaixem em moldes que não são os seus.

Embora o mundo atual pareça mesmo priorizar a desinibição, há lugar para as pessoas tímidas. A maneira própria de olhar para a realidade pode trazer contribuições que só nos enriquecem socialmente. O desafio poderá residir então na capacidade de equilibrar expectativas sociais com a aceitação de diferentes formas de ser e de se manifestar.

Ana Beatriz Condinho
(Psicóloga Clínica; Psicoterapeuta)

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