Entre um pardal empoleirado e um homem envelhecido que só anda amparado na sua bengala há uma diferença gigantesca de equipamento biológico. A natureza privilegiou o pardal. Cabe ao Homem a manutenção de hábitos de atividade para evitar que o desequilíbrio seja sinónimo de envelhecimento, por falta de treino e degenerescência dos sensores. Há células especializadas em detetar onde está a nossa cabeça

Lá do alto, o pardal olha para o idoso que caminha cambaleante, agarrado ao pequeno cajado que o ampara. Aquela pequena criatura, poisada sobre as suas minúsculas patinhas num fio elétrico a mais de 10 metros do chão, exposta aos caprichos do vento que lhe fustiga as penas, escarnece do ser mais evoluído do planeta, naquilo em que manifestamente se lhe impõe: o equilíbrio.

O equilíbrio corporal é uma tarefa primordial dos vertebrados, que depende dum delicado controlo exercido pelo sistema nervoso central (principalmente o cerebelo), sobre o estado dos músculos e das articulações, permitindo ao corpo manter certas posições estáticas e deslocar-se harmoniosamente. Este controlo é inconsciente, mas constante e dinâmico, e proporcionado pela informação fornecida pela visão e pelo aparelho locomotor (sensores nos músculos e articulações) mas, sobretudo, pelo ouvido interno.

Comparado às estruturas nervosas dos outros grupos de vertebrados, a estrutura do encéfalo das aves é similar à dos mamíferos. Apesar da extrema inferioridade comparativa com os humanos, no que respeita aos hemisférios cerebrais, o cerebelo e os lobos visuais do pequeno pardal são desproporcionalmente sobre dimensionados! A Natureza providenciou- lhe, portanto, equipamento privilegiado para manter o equilíbrio.

Ao contrário da grande maioria dos animais terrestres, o ser humano utiliza também apenas dois membros para andar. Necessita, por isso, para não cair, que as forças produzidas pelos músculos se equilibrem continuamente, que a sua ação seja de tal forma coordenada que enquanto uns se contraem, outros se relaxem numa sincronia perfeita.

O recém-nascido aprende a equilibrar-se identificando as informações fornecidas pelos recetores sensitivos, localizados na pele e mais profundamente, sobretudo nas articulações, que lhe fornecem uma valiosa informação sobre a situação do corpo no espaço e sobre a posição relativa de todas as partes do corpo, orientando-se pela visão que lhe proporciona uma ideia global da situação do corpo, relativamente ao espaço envolvente e pontos de referência de grande importância. Mas é no aparelho vestibular do ouvido interno que se encontra o autêntico órgão do equilíbrio: uma série de estruturas dotadas de células sensoriais especializadas que, em conjunto, detetam constantemente a posição da cabeça em estado de repouso e os movimentos que realiza.

Esta capacidade é uma das potencialidades que a criança adquire na infância, produto de uma aprendizagem intensiva associada a um engenho orgânico complexo. De facto, tal como acontece com outras habilidades motoras, é possível desenvolver o equilíbrio de uma forma notória com o treino adequado. Aprende-se a efetuar de maneira automática trocas mínimas de atitude do corpo, relativamente às posições adotadas, de forma a modificar o centro de gravidade, com o qual se pode chegar a manter o equilíbrio em diferentes posições e movimentos, de forma progressivamente mais habilitada.

Nos tempos atuais, o desequilíbrio é uma patologia cada vez mais frequente. Isso deve-se essencialmente ao aumento da longevidade, mas também ao estilo de vida confortável e sedentário dos nossos dias. A falta de treino decorrente das condições de vida, associa-se à degenerescência dos sensores e equipamento de integração e controlo resultante do envelhecimento das populações.

O requisito básico é seguir um treino específico, sem dúvida trabalhoso, mas que cada vez mais é necessário instituir na rotina social dos indivíduos. Esta é uma prática há séculos integrada na cultura de algumas civilizações, nomeadamente orientais, que contribui de forma indelével para uma velhice saudável e de qualidade.

Luís Filipe Silva
(Médico, Otorrinolaringologista)

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