Não vivemos sem ele, porque está presente em todas as células. Mas podemos morrer por causa dele. Os valores e o tipo de colesterol ditam o risco de ter um enfarte do miocárdio ou um acidente vascular cerebral. Os níveis são o problema e as estatinas são a solução de primeira linha, porque a nova aposta de tecnologia RNA ainda não chegou a Portugal

Simplificando, há o colesterol HDL e o colesterol LDL, juntos fazem o colesterol total que, deve situar-se sempre abaixo dos 190 mg/dl. À medida que a idade avança e sempre que se juntam duas pessoas, é comum a conversa começar por comparar os valores de colesterol. Mas, nem todos se importam em seguir este valor, apenas a faixa etária acima dos 55/60 apresenta interesse, porque, segundo um estudo recente da Fundação Portuguesa de Cardiologia, 3 em cada 4 portugueses desconhecem os seus níveis de colesterol, apesar de um quarto dos portugueses apresentar um risco elevado com valores acima dos 240 mg/dl.

A definição de risco não é assumida isoladamente, mas se existirem fatores que contribuem para a deposição de gordura nos vasos sanguíneos e, consequentemente, de aumento de processo inflamatório, por si só, já é significativo e um alerta para a existência de aterosclerose, angina do peito, enfarte, acidente vascular, hipertensão e insuficiência cardíaca. A situação poderá ser um bom exemplo da velha história de “peixinho com rabo na boca”, porque as alterações dos níveis de colesterol normalmente estão associadas a outros fatores de risco, como o sedentarismo, má alimentação e hábitos tabágicos.

As estatinas são a resposta terapêutica que, desde os anos 80, se apresenta como uma classe de medicamento de primeira linha no combate à principal causa de morte em Portugal e são prescritas porque se acredita que reduzem significativamente o risco de morte cardiovascular. 

Para os cardiologistas, as estatinas representam o maior avanço terapêutico da doença coronária, a par com outros procedimentos como o o bypass coronário, a angioplastia coronária e a terapêutica trombótica na fase aguda do infarto do miocárdio. Mas note-se bem, as estatinas não curam, apenas controlam o problema, principalmente, nos casos em que o risco de morte ou de complicações associadas a valores elevados de colesterol é muito alto. Por exemplo, nos casos em que já existe uma doença cardiovascular, a progressão da doença ou a possibilidade de novos eventos reduz-se em 50%.

As estatinas são prescritas sempre que é necessário baixar o mau colesterol (LDL), o colesterol total e/ou os triglicerídeos, ajudando a prevenir a doença coronária, a aterosclerose, enfarte ou AVC ou procedimentos de revascularização. A dieta alimentar e o exercício físico podem ser a primeira linha de recomendação para baixar os níveis de colesterol, contudo, não raras vezes, isso não é suficiente – seja porque não há uma adesão, seja por questões do metabolismo de cada um de nós. Mas as alterações do estilo de vida devem acompanhar a toma das estatinas e não basta tomar o comprimido certo e ficar a pensar que a terapêutica resolve o problema. Não é bem assim. As escolhas que fazemos no nosso dia-a-dia têm um papel crucial na prevenção de doenças e o comportamento de cada um de nós continua a ser a pedra basilar.

Por outro lado, as estatinas também não são todas iguais. A sinvastatina, a atrovastatina e a rosuvastatina são da mesma família, mas não são bem iguais, ao mesmo tempo que a prescrição pode variar entre baixa intensidade, intensidade moderada e alta intensidade. O objetivo é sempre o mesmo, mas a prescrição certa depende do risco em desenvolver doença cardiovascular ou necessidade de controlar o risco. Mas uma vez prescrito este medicamento, a toma não deve ser interrompida, sem que haja uma indicação do cardiologista.

Claro que, como toda e qualquer medicação – ou mesmo produtos naturais – cada um de nós tem uma forma única de metabolizar a substância. E por isso os efeitos secundários existem e estão descritos como: dor de cabeça, dor de estômago ou abdominal, excesso de gases intestinais, náuseas ou vómitos, dor muscular, prisão de ventre ou diarreia, dor muscular, nariz entupido e espirros ou dor de garganta. Nos efeitos adversos, começam a surgir alguns estudos onde se conclui que, em algumas pessoas, pode aumentar o risco de vir a ter diabetes. Ou seja, num grupo de cem pessoas, cinco podem ter diabetes nos próximos quatro anos, mas se não tomarem estatina 4 a 5 pessoas terão a mesma probabilidade de vir a ter diabetes. Ou seja, 95 a 96 pessoas não terá diabetes.

Em Portugal e, segundo o Instituto Nacional Ricardo Jorge, 52,3% dos portugueses têm níveis elevados de colesterol e a elevada percentagem é justificada pela obesidade, sedentarismo e tabagismo, todos eles fatores de risco cardiovascular e com probabilidade de contraírem diabetes… A todos estes indicadores, ainda falta associar a hipertensão arterial, também ela responsável pela desorganização da normalidade e que, por si só, exige uma abordagem diferenciada em outro momento.

Os benefícios e os riscos devem ser ponderados, porque a toma de estatinas não tem um prazo. Em regra, a doença é crónica e as estatinas apenas controlam os valores, não tratam ou curam a causa. Se o risco for alto, a toma é para toda a vida, se o risco for considerado moderado e existir uma verdadeira mudança do estilo de vida, poderá ser possível reverter a necessidade da toma.

As alternativas às estatinas quando o risco não é muito elevado existem, mas podem não ser suficientes: alimentação rica em fruta, vegetais, peixe e gorduras saudáveis; atividade física diária, com exercício de intensidade moderada pelo menos de duas horas e meia por semana, não fumar e controlar o peso.

Num futuro breve existirá outra alternativa. Ou seja, apenas uma injeção a cada 6 meses. O princípio ativo do novo medicamento, já foi aprovado pela Agência Europeia do Medicamento, mas ainda não está à venda em Portugal, chama-se Inclisiran e baseia-se em tenologia RNA. A facilidade da toma poderá ser uma vantagem na adesão à terapêutica, que promete alterar a potência do efeito do tratamento, sendo por isso especialmente recomendado em doentes de risco elevado.

Carlos Andrade
(Médico, Cardiologista)

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