Não é uma encantadora história infantil, mas poderia ser. Neste caso, o feiticeiro da corte é um médico oftalmologista e a princesa que sonhava ser igual às outras pode ser uma criança ou um adulto. O músculo elevador continua a ser o vilão para ambos os casos e a ptose não é nenhum feitiço, mas sim uma disfunção que tem tratamento
Era uma vez uma bela princesa de um país distante… rodeada de alegria e adorada por todos, encantava com o seu temperamento e carácter, mas havia algo que ensombrava o seu coração… achava que não era tão bela como as outras princesas porque tinha um olho mais fechado que o outro! Isso deixava-a triste… muito embora todos desvalorizassem tal alteração, ela sentia que todos olhavam para ela de forma estranha! Nos últimos tempos até achava que isso a estava a deixar a ver pior…
Certo dia resolveu ir falar com o feiticeiro da corte para perceber porque se sentia assim e se podia fazer algo… algo que lhe permitisse viver, brincar e ser feliz como as outras. Este podia ser o início de mais uma encantadora história, mas a narrativa faz parte da vida real e deste tempo, século XXI.
A pálpebra caída ou ptose palpebral, situação em que existe uma posição anormalmente baixa da pálpebra superior, altera significativamente a estética e mímica facial e, consequentemente, a autoimagem e a autoestima Além disso, pode alterar a qualidade visual e de visão de contraste e afetar o campo visual, mesmo em casos sem atingimento do eixo visual.
A ptose é uma disfunção que pode afetar crianças ou adultos e pode ser tratada para melhorar a visão e a aparência. A mudança pode e deve começar por um estudo aprofundado das causas, porque podemos estar na presença de uma situação congénita ou adquirida, aponevrótica ou miogénica, unilateral ou bilateral, mais ligeira ou mais severa e com nuances como modificações da posição da pálpebra com movimentos da mastigação, por exemplo. Um estudo oftalmológico completo é fundamental, nomeadamente em termos de motilidade ocular, estudo da superfície ocular e avaliação neuroftalmológica.
É crucial começar por estudar as características das pálpebras, pois é essa análise que vai ajudar a delinear um plano terapêutico mais preciso. É necessário avaliar o movimento da pálpebra, a função do músculo elevador, a definição e altura da prega da pálpebra superior e o recrutamento ou não do músculo frontal…
Ptose nas crianças
As crianças nascidas com ptose palpebral têm aquilo que chamamos de ptose congénita, habitualmente causada por problemas no músculo que eleva a pálpebra (o músculo elevador da pálpebra superior). O sinal mais óbvio é a queda da pálpebra superior cobrindo ou não a pupila, mas outros sinais podem ser encontrados, como a ausência de simetria das pregas palpebrais, um torcicolo com elevação do queixo ou elevação acentuada das sobrancelhas para ver melhor.
Ocasionalmente, uma criança que nasce com ptose congénita pode ter outros problemas oftalmológicos, como estrabismo, doenças musculares, tumores e outros e também um compromisso visual conhecido por olho preguiçoso, seja por atingimento do eixo visual, seja pelo aparecimento de visão distorcida por astigmatismo secundário. Um estrabismo também pode surgir.
Ptose nos adultos
Na maioria das vezes a ptose surge nos adultos como resultado de um estiramento ou desinserção do tendão do músculo que eleva a pálpebra superior. Esta situação pode surgir pela idade ou pode ser secundária a um traumatismo.
Perceber a causa é importante para avaliamos qual o melhor tratamento, pelo que alguns testes poderão ser solicitados antes da cirurgia.
O tratamento
Estabelecer qual a melhor técnica para corrigir a ptose palpebral é fundamental, assim como a experiência do cirurgião. Obter o melhor resultado estético é importante num adulto, bem como o alívio das queixas de cansaço e peso palpebral ou de amputação do campo visual.
Já na criança, recomenda-se a solução cirúrgica para melhorar a visão e ao mesmo tempo para ajudar no tratamento da dita ambliopia, condição que deve também ser tratada, seja com óculos, penso ocular ou gotas, tudo estratégias que devem ser aplicadas para ajudar a fortalecer o olho mais fraco.
Na maioria das ocasiões, o procedimento cirúrgico é realizado em ambulatório recorrendo a anestesia geral nas crianças e local com sedação nos adultos, ajustando a posição dos músculos que definem a posição da pálpebra superior e a intervenção é altamente eficaz e segura. Ocasionalmente, técnicas mais ou menos complexas, recorrendo a enxertos ou materiais sintéticos, também podem ser utilizadas.
Era uma vez uma princesa…
… que ficou igual às outras.
Rui Tavares (Médico Oftalmologista)
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