Imagine o que seria passar dias, semanas, sem lavar a cara, os dentes; sem poder comer, sorrir, falar; fazer a barba ou maquilhar-se. A nevralgia do trigémeo é isto que provoca, uma dor intensa, que retrai todo e qualquer movimento

É um nervo, principalmente sensitivo, com três ramos (nervo oftálmico, do maxilar e da mandíbula) e, por isso mesmo, a designação de trigémeo. Este é um dos nervos cranianos com mais ramificações em todo o seu trajeto, começa no encéfalo e termina nas ramificações finais. Com um funcionamento em par, um de cada lado, são estes os nervos responsáveis pela sensibilidade na face e por funções como mastigar ou falar.

Imagine os efeitos de não conseguir tocar na face, falar, rir, comer ou mesmo lavar o rosto. O medo da dor alucinante paralisa este tipo de atividade. Não raras vezes e por não se compreender o que está a acontecer, arranca-se dente atrás de dente e a dor mantém-se. É em desespero que estes doentes entram no gabinete de consulta. Na nevralgia do trigémeo é tudo isto que acontece.

A vida destas pessoas fica virada de pernas para o ar. Desesperante e incapacitante, sublinham. Não falam, com medo de despertar a dor e escrevem tudo num papel. Alguns já não mastigam há várias semanas; outros nem se atrevem a emitir uma palavra, com medo de despertar a dor muito intensa, tipo choque elétrico, repetida e que surge em fisgadas e com elevada frequência. Este é o sintoma comum.

A nevralgia do trigémeo é quase sempre a causa. O diagnóstico é feito por médico neurologista, que recorre à confirmação por ressonância magnética e a solução pode ser terapêutica. Mas nem sempre, nem nunca. Há casos em que a medicação não surte qualquer efeito. Aliás, os vulgares analgésicos não são recomendados para este tipo de dor alucinante e desesperante, porque não atuam no gatilho e não produzem qualquer efeito.

É preciso excluir se a causa da nevralgia é ou não provocada pela atuação de um tumor ou por uma infeção pelo vírus herpes zóster. Na maioria das vezes, a causa é desconhecida e o nervo está apenas comprimido porque existe uma artéria anormal ou má posicionada. E, nesse caso, a atuação pode ser cirúrgica.

A nevralgia do trigémeo é uma situação rara e quando se manifesta é mais comum nas mulheres, tende a afetar adultos de todas as idades, mas acaba por ter maior incidência em pessoas com mais de 50 anos.

A dor pode aparecer de forma espontânea e pode demorar apenas alguns segundos ou dois longos minutos, mas é comum repetir-se várias dezenas de vezes num só dia, sem que se descubra qual o ponto-gatilho.

Se a causa estiver na posição anómala de uma artéria, cabe ao neurocirurgião fazer a separação, recorrendo a uma espécie de esponja para evitar o contato com o nervo trigémeo. Basta este gesto para a dor alucinante desaparecer durante anos. 

A técnica denomina-se descompressão vascular e os pacientes revelam alívio quase imediato. Há um risco, aliás, toda e qualquer cirurgia não é isenta de risco, pelo que essa linha deve ser sempre bem ponderada. A intervenção cirúrgica pode causar algum grau de sensação de dormência na face.

Jorge Gonçalves
(Médico, Neurocirurgião)

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