Sempre que tentamos caminhar no escuro ou andar em cima de um colchão mole estamos a provocar um conflito sensorial externo. É este tipo de conflito que também acontece quando há um défice patológico num dos quatro pilares do equilíbrio. As informações sensoriais são discrepantes e a sensação de queda ou a ilusão de movimento são reações que se seguem.
A tontura é um sintoma que afeta um grande número de pessoas e que é descrito das mais variadas formas: cabeça oca, leve ou pesada, sensação de desmaio ou falta de forças. Na verdade, a tontura pode ser proveniente de várias disfunções dos sistemas corporais – cardiovascular, vestibular, visual, músculo esquelético, homeostático,
A vertigem, por si, é uma forma particular de tontura, uma vez que apresenta características definidas: é uma ilusão de movimento, frequentemente rotatória (como se andasse num carrossel ou montanha russa), da própria pessoa ou do seu meio circundante. Este sintoma, que pode ser muito incapacitante, está intimamente relacionado com a disfunção do sistema vestibular do ouvido interno. Consequentemente, existem queixas associadas de desequilíbrio, alterações da postura e sensação de queda e, de uma forma quase sistemática, estas acompanham-se de sintomas neurovegetativos de náusea e vómito.
Estes fenómenos relacionam-se com a disfunção de um dos pilares no equilíbrio. Para manter a verticalidade e a visão estável, o nosso corpo tem um polígono de sustentação que se baseia em 4 pilares base, 3 de entrada sensorial e 1 coordenador central: as informações que nos chegam pela visão, pelos recetores articulares e musculares (propriocepção) e do sistema vestibular do ouvido interno, são integradas centralmente a nível do tronco cerebral e do cerebelo, para que possamos ter uma imagem focada na retina e estabilizar a postura quando nos movimentamos.
Desta integração de informação, resultam dois reflexos (o reflexo vestíbulo-ocular e o reflexo vestíbulo-espinhal), que atuam como os efectores para andarmos de pé direitos e sem ver os objetos a balançar. O sistema vestibular situa-se no labirinto do ouvido interno e tem vários recetores: os canais semicirculares são captores angulares e o sáculo e utrículo captores lineares (vertical e horizontal) – são estes sensores que permitem que o nosso cérebro perceba a posição relativa da cabeça nos três planos espaciais.
Existe uma hierarquia na utilização dessas informações: a visão é mais importante que o labirinto e este mais importante que a propriocepção, de tal forma que, sendo coerente, desencadeia mecanismos que vão coordenar os músculos anti-gravitacionais e manter a postura, ao mesmo tempo que o reflexo vestíbulo-ocular estabiliza o olhar, em situações de movimento da cabeça.
Quando as informações não são coerentes, desencadeiam-se conflitos sensoriais e as estruturas centrais tentam optar pela informação que melhor possa manter a verticalidade e visão estável, podendo livrar-se de informações erradas ou supostamente erradas, utilizando funções em detrimento de outras. Estes conflitos sensoriais podem ser decorrentes de situações externas provocadas, como andar num navio pequeno no mar ou em cima de um colchão mole, bem como tentar caminhar no escuro ou por défices patológicos nos sistemas de entrada sensoriais referidos, nomeadamente o sistema vestibular e de uma forma assimétrica – ou seja informações discrepantes relativas a um e outro lado.
Quando existe um estímulo anormal vestibular (seja por défice agudo ou irritabilidade), desencadeia-se inicialmente sensação de vertigem (que surge por aparecimento de um movimento característico dos olhos, chamado nistagmo em resultado de reflexos estíbulo oculares não simétricos). Este sintoma será depois atenuado pelos mecanismos complementares referidos, mas pode conduzir a défices mais ou menos prolongados de alteração do equilíbrio, da postura e da estabilização do olhar, que impliquem novas estratégias de compensação, substituição ou habituação, por alterações nas simetrias dos reflexos oculomotores e espinhais. Estas estratégias devem-se aos mecanismos de neuro plasticidade do sistema nervoso.
Numa fase aguda, é importante que o doente seja estabilizado e os sintomas neurovegetativos controlados (nomeadamente através do uso de fármacos) para que se possa iniciar uma compensação central com a instalação de um novo equilíbrio e, consequentemente, o desaparecimento dos sintomas. No entanto, é frequente que associado a este estado agudo surjam medos e inseguranças que não só podem atrasar e impedir a compensação, como também permitir estratégias erradas que perpetuem determinados sintomas.
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Ao ler este artigo, sorri…..pois ontem fui com um meu familiar a uma consulta a um hospital público de Lisboa, onde nos fui explicado de uma forma muito similar a este post o que se passava com a sua falta de equilíbrio quase constante e a sua falta de audição num dos ouvidos e onde iniciou uma série de exercícios para lhe melhorar a qualidade de vida, mas tudo isto depois de eu andar a pesquisar e insistir com os médicos que havia mais do que a medicação que se poderia fazer para que esse meu familiar ainda relativamente novo deixa-se de se sentir tão mal, ao ponto de não querer sair de casa, só em caso de grande necessidade o fazia!
ReplyNormalmente ouvi atribuir esses problemas a idade, mas não é verdade…..há muitos outros factores como aqui é explicado a que não se dão a devida importância……e conclusão !!
A quem sofre destes problemas não se deixem “ficar” parados …insistam noutras formas de solução para tornar o vosso problema mais suave, pois eu sei o quanto pode ser incapacitante!!!
Peço desculpa da minha longa narrativa, mas é no desejo de alertar…..ainda é cedo para certezas dos resultados. A verdade é que de alguma forma a saída do gabinete foi diferente……
Obrigada a toda a equipa do CCC por nos brindar sempre com tão bons artigos!
Felicidades para todos e em especial para o Dr. Travassos.
Bom-dia.
ReplyTenho acompanhado as vossas informações, que considero muito úteis. Em relação ás tonturas, gostaria de ser informado do motivo que leva a que quando me levanto e saio do carro, as sinto com intensidade, ao ponto de ter de me apoiar ao mesmo, pois é forte a sensação de queda.
Grato pela vossa atenção.
AJVital
Bom dia Alvaro,
As tonturas que nos refere podem carecer de uma avaliação médica, na especialidade de Otorrinolaringologia, para despiste de qualquer patologia do ouvido que possa estar na origem dos sintomas.
Não podemos emitir qualquer opinião, desconhecendo a sua situação clínica.
Caso pretenda marcar uma consulta, pode fazê-lo através do nr. 239 802 700.
Muito obrigado.
ReplyBom-dia
ReplyGrato pela resposta á questão que vos coloquei e que irei ter em conta. Desejo-vos continuação do bom serviço que prestam, com os artigos publicados.
Obrigado
AJVital