As memórias não têm de ficar presas no passado ou arrumadas no lugar dos sonhos. As memórias foram experiências, factos, informações, emoções… Mas, como e onde arrumámos o dia 25 de abril de 1974?
Lembra-se onde estava no 25 de abril? Uma pergunta, fora de contexto e sem registo de tempo, mas que remete a memória de quem viveu o abril de 74 para os episódios da Revolução e dos cravos. Depois, cada um de nós acrescenta-lhe os pormenores individuais, as imagens, os cheiros, os sons e as emoções que guardou desse dia. A memória funciona assim e o futuro deve ser construído com base nessas memórias que vamos armazenando.
Um dia, há 44 anos, este foi o dia de uma revolução sonhada. A democracia emergiu no meio de uma amálgama de interesses pessoais, partidários, de omissões e de ilusões. A ditadura tinha mantido a inteligência reprimida, as opiniões amarfanhadas, as bocas rolhadas e a sociedade humilhada.
Mas nenhuma revolução é só sonhada! Quando uns a sonham, outros opõem-se, ou pior, infiltram-se para jogar o jogo da oportunidade. Por regra, quando o jogo é claro, ganha o mais forte ou o melhor preparado.
Mas nem sempre é assim. Os revolucionários sonham, os conservadores pensam e os infiltrados aproveitam-se…
Tenho o maior respeito por todos os que lutam por ideais… Mas, abomino os infiltrados. Nos jogos de poder há sempre esse risco. Nem só as balas vencem as guerras… A manteiga lubrifica o estômago e dá força para a luta.
A gestão de um país não é fácil. Há que gerir muitos quereres, muitos interesses, muitas dissonâncias. Há que encontrar líderes políticos que acreditem que o interesse comum deve impor-se sempre aos interesses individuais. Mas, a democracia é muito mais e há uma retaguarda essencial a toda e qualquer democracia. A educação, a justiça e saúde são mais importantes do que todo o arsenal roubado de um qualquer paiol.
O 25 de abril aconteceu há 44 anos, mas a justiça continua ténue, a educação frágil e a saúde engripada.
Os infiltrados andam por aí e a revolução não está ganha.
Passados 44 anos, permitam-me que pergunte à democracia portuguesa o que anda a fazer? A justiça é uma teia em que não acredito, porque me parece vocacionada para caçar mosquitos. A educação transmite conhecimentos de professores desresponsabilizados, sem autoridade, muitos sem a família que o ministério ignorou e/ou ajudou a destruir e, quanto à saúde que é a área que conheço melhor, perdoem-me de só presumir que está doente. Doente, porque todos nós estamos doentes. Doente, porque a própria Democracia está doente. Doente, porque a Política está moribunda e não há Filosofia nem filósofos que nos eduquem para uma vida em sociedade. Doente, porque vivemos numa sociedade de chicos-espertos. A epidemia é grave e não afeta só os “chiquinhos” – alguns já com direito a médico de família – afeta-nos a todos.
Não é certamente necessário um novo 25 de abril, mas é preciso pensar e repensar o nosso País. O que andamos a fazer com as nossas memórias? Onde as arrumámos?
(Médico Oftalmologista)
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Sr Dr Travassos, muitos parabéns pelo texto , infelizmente muito realista .
ReplyO 25 de abril foi totalmente desvirtuado e agora é quem mais se apropria do que não é dele
Afinal não é o Povo quem mais ordena
Tenha um bom dia
Abraço
Ana Teresa
Pois é, caro Senhor. O sonho era muito lindo. Mas esfumou-se…
ReplyOs infiltrados, com peles de cordeiro, montaram uma peça teatral a que chamaram – e ainda chamam – "democracia", mas que na realidade são grupos de malfeitores que se organizaram numa "partidocracia". Até que venha nova "lufada de ar fresco"…
Parabéns E.xmo Senhor Dr.Travacos, sou do tempo da outra Sra. e foi sempre o que sonhei para o meu país, termos um país de trabalhadores com justiça e bem estar para o nosso povo aquilo que mais nos falta tenha uma boa tarde e um grande Abraço
ReplyTexto bem pequeno, mas cheio de verdades.
ReplyA expressão da desilusão tal como a sinto.
ReplyProcuro na literatura disponível de alguma seriedade histórica e o que venho a concluir há uns anos é que Portugal nunca passou de um projeto Após sucessivas revoluções, regressamos sempre ao ponto de partida apenas com um novo oportunista a pastorear o rebanho.
Portanto, Caro Dr Travassos a sua elevada postura, que tive oportunidade de constatar, esbarra com a multidão de oportunistas da mais variedade de espécies.
Cumprimentos
JC