Ontem, entrou-me pelo aquário uma Sereia… E a dois metros de distância, soprou-me um beijo e de lágrimas na face, afirmou: há 20 anos, deixei de ver o Mundo e caminhei por um túnel de cegueira, sem esperança, com a alma estilhaçada pela luz que perdi. Hoje, estou aqui, a uma distância de segurança, para o abraçar e lhe dizer obrigado. Obrigado por me ter ajudado a recuperar a Visão e a Vida… Fixei a senhora e tive a perceção que deixei, momentaneamente, de a ver. Numa fração de segundos, o meu cérebro, atirou-me para o mar de cegueira, de onde há 20 anos, pesquei aquele olhar, agora recuperado. A visão que me via e a alma daquela Mulher a chorar, por não ter de chorar, por não ver…

No último dia do ano vinte, adormeci feliz… Às 2 horas de 4 de Julho de 1999, há 21 anos atrás, tinha finalizado os rasgos que na pedra basáltica e na Capela do Centro hoje recebem as duas faixas verticais de luz… Com uma rebarbadora vitrectomizei aquela lava vulcânica e entranhei-lhe luz… Num ato de espiritualidade que às vezes a cirurgia transmite.

Em 21 anos de História, a lava, as lágrimas e o sofrimento, justificam o querer e o acreditar que a luz está por perto. O Centro existe para ajudar os que acreditam, os que querem chorar de alegria, para não chorarem por terem perdido parte da Alma. Uma Sereia gosta sempre de ver o Mar, porque aí nasceu a Vida.

Obrigado a todos os que acreditaram em mim.

António Travassos

(Médico Oftalmologista)

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