Há rinites e rinites, a alérgica chega agora, com a Primavera e para um terço da população portuguesa começa a época da “maldição”… Entre espirros e lágrimas, a estação da bênção transforma-se na época do desassossego

 

A rinite alérgica é uma das formas de rinite; a rinite que se caracteriza por inflamação da mucosa nasal, qualquer que seja a etiologia. Nem sempre é fácil estabelecer a causa – a rinite pode ser medicamentosa, vasomotora, hormonal. O doente queixa-se de obstrução nasal, associada a uma quantidade variável de corrimento nasal anterior ou posterior; se a esses sintomas se somam espirros frequentes e prurido, nasal ou ocular, a etiologia alérgica deve surgir nas nossas mentes. Mas há outros detalhes que nos alertam. A história familiar de alergias, a história pessoal de atopia, bronquiolites na infância e a ocorrência em “crises” que respondem bem a terapêutica com anti-histamínicos.

E coloca-se a questão: é importante determinar a etiologia? Sim. Apesar de algumas possibilidades terapêuticas serem comuns, há inúmeras medidas específicas de cada forma de rinite. Por exemplo, na rinite medicamentosa, se eliminarmos o agente causal – mais frequentemente os vasoconstritores nasais, cujo rápido efeito se paga caro na utilização prolongada sobre a mucosa nasal – resolvemos o problema. 

Na rinite alérgica, nem sempre é fácil eliminar o agente causal. Mas podemos tentar controlá-lo e até fazer medicação prévia à exposição. Os testes alérgicos, cutâneos ou sanguíneos, permitem identificar os agentes causais específicos em cada paciente. Mas, nem sempre, nem nunca. Cada vez mais se reconhece uma entidade clínica designada como rinite alérgica local (RAL), que parece corresponder a uma reação localizada, sem anticorpos circulantes dirigidos ao alérgeno e portanto não identificável pelos testes alérgicos comuns. É possível identificar as alterações na mucosa nasal destes doentes quando expostos ao alérgeno, mas os testes laboratoriais não estão disponíveis correntemente pelo que o diagnóstico é, por isso, clínico.

É na etiologia específica da rinite alérgica que entra a nossa aguardada Primavera. Se os ácaros, a causa da “alergia ao pó” de acumulação, nos acompanham ao longo de todo o ano, é nesta altura que a carga máxima de pólenes anda pelo ar. E os potencialmente mais perigosos não são os que nos assustam, como o pólen amarelo das acácias, mas os invisíveis para os nossos olhos; quanto menor o seu tamanho, maior a sua capacidade alergizante.

Para algumas pessoas começam meses de sofrimento. Obstrução nasal, lenços sem fim, comichão, espirros. Mas também cefaleias, ressonar, insónia e cansaço persistente. Os sintomas podem ser intermitentes ou persistentes; ligeiros, moderados ou severos.

Se falamos de um terço da população portuguesa com rinite alérgica, destes, cerca de 20% tem conjuntivite alérgica e 10-20% tem asma. Felizmente, existe tratamento. As medidas terapêuticas são gerais, médicas e cirúrgicas.

As medidas gerais são os cuidados que podemos ter. Evitar a multiplicidade de objetos que acumulem pó – os ácaros não gostam do minimalismo. Evitar secar a roupa na rua durante os meses de maior polinização. Viajar com as janelas do carro fechadas. Tomar a medicação antialérgica antes da exposição aos alérgenos. Manter uma boa ventilação dos espaços, arejando a casa pela manhã e ao fim do dia; mas evitar abrir as janelas quando a carga polínica é mais elevada.

Os recursos online são uma boa ajuda: a Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica, SPAIC, através da rede portuguesa de aerobiologia (RPA), disponibiliza semanalmente o Boletim Polínico em Portugal, que permite conhecer a concentração previsível dos alérgenos inalantes polínicos mais comuns e adaptar a medicação e as atividades de vida diária. Consultar https://www.rpaerobiologia.com/.

A medicação mais frequentemente utilizada são os corticoides inalados e os anti histamínicos, orais ou inalados; mas podem associar-se outros grupos terapêuticos. Em alguns doentes, a solução passa por uma imunoterapia específica, vulgarmente designada dessensibilização ou “vacinas”.

Em caso de falência da terapêutica médica, a cirurgia é adjuvante, como complemento e nunca como solução definitiva – porque a rinite alérgica é uma doença crónica que se pretende controlar e não curar.

Como quase sempre em Medicina, a solução é individual e única. Depende da arte da relação médico-doente para se encontrar a fórmula mágica, que irá permitir ao doente conviver com a patologia sem prejuízo da sua qualidade de vida. Ou seja, viver e respirar a Primavera em cada dia.

 

Vera Sofia Soares

(Médica Otorrinolaringologista)

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