A falta de tempo para cozinhar e até para comer é o melhor argumento que nos vem à cabeça para justificar todos os devaneios alimentares. Caímos na cilada do quinto pecado mortal, a gula
Gordos. Roliços. Obesos. Barrigudos. Anafados. Rechonchudos. É assim que estamos e a culpa é dos excessos. Fingimos não saber. Sabotamos as soluções e confiamos que uns quilos a mais não farão mal ao mundo. O problema é que os quilos são nossos e, sem perceber, estamos todos a aumentar o peso na balança, mas também os lucros de uma poderosa indústria alimentar. Caímos em todas as armadilhas e deixamo-nos convencer pelo que parece ser o “mais saudável”; o “mais rápido”; “o mais económico” ou “o mais saboroso”. A tentação é grande, exige resistência.
O mercado parece querer oferecer sempre o melhor e, se por um lado, esticamos a mão e temos a abundância, do outro estendemos o braço e temos os mais variados pacotes de dietas. Prometem o que queremos ouvir, a perda de peso com as chamadas “dietas da moda”, mas se funcionassem mesmo seriamos nós, os portugueses, um país de gente com excesso de peso? Claro que as dietas não são rápidas (pelo contrário) e claro que sucumbimos facilmente ao pecado da gula. A falta de tempo para cozinhar e até para comer é o melhor argumento que nos vem à cabeça para justificar todos os devaneios alimentares.
Começamos por pensar que “é só hoje”, mas depressa nos viciamos no facilitismo das refeições rápidas e estes alimentos estão suficientemente recheados com os ingredientes que nos transformam em pessoas dependentes. Em concreto, o sal e o açúcar, disfarçado ou descaradamente à mostra viciam, tornam-nos dependentes e por isso queremos continuar a repetir… e a repetir… O excesso de peso nem sempre nos trava e, de bocadinho em bocadinho, com o passar dos anos, os quilitos a mais transformaram-se em excesso de peso. E uma vez obeso, mesmo que volte ao peso normal, será sempre potencialmente obeso, porque a obesidade não é apenas uma caraterística, é uma doença crónica.
O motivo por que engordamos é sempre o mesmo, ingerimos mais calorias do que aquelas que gastamos e é esta diferença que se vai acumulando sob a forma de gordura. Manter este excesso durante algum tempo apenas agrava o problema. Poderemos ser travados pela doença que, “quis o destino ou a má sorte”, veio sem aviso prévio, porque nunca nos lembramos que andámos a comer em excesso. Mais tarde ou mais cedo, as nossas atitudes refletem-se na nossa saúde e não existem dietas que façam perder peso, rapidamente e de uma forma saudável, os excessos que andámos a acumular durante anos.
O peso corporal é um indicador crítico e protege contra numerosas doenças. Um índice de massa corporal elevado indica sempre um risco aumentado para diversas doenças: diabetes, doença cardíaca, esteatose hepática (fígado gordo), hipertensão, desordens de humor, anomalias de reprodução e risco de cancro. O excesso de peso altera o perfil hormonal e metabólico e coloca em carga física aumentada vários órgãos do corpo. Não há dúvidas sobre essas consequências, nem a comunidade científica se divide. Há certezas e evidências que nos ajudam a prever o risco de ficarmos doentes. A nutrição e uma vida saudável são inseparáveis. Porque ignoramos esse conhecimento já tão evidente?
Voltamos a repetir: sempre que ingerimos mais calorias do que as que queimamos, esse excedente é transformado em gordura e sempre que começamos uma dieta e perdemos peso, o nosso metabolismo altera-se e passa a gastar ainda menos calorias. A isto chama-se adaptação metabólica, porque a perda de peso é entendida como uma ameaça à sobrevivência da espécie. Deu jeito ao Homo Sapiens, mas acaba por ser um contratempo para a sociedade do século XXI.
Paulo Queiroz
(Médico, Medicina Geral e Familiar)
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