É uma frase comum, principalmente com a chegada do inverno. Mas, se assim fosse, como seria viver na Suécia? Explicamos a lógica da reação ao frio e a influência que pode ter nos músculos e articulações, para percebermos se a frase encaixa num mito ou na realidade

Os músculos e as articulações doem com as alterações meteorológicas, em concreto, com o frio? Partindo desta ideia, muito comum e partilhada no inverno, diversas investigações tentaram procurar uma explicação que validasse esta queixa. Mas, surpresa das surpresas… De entre as diversas publicações científicas, nenhuma sustenta a existência de uma relação linear entre as alterações meteorológicas e a ocorrência de dores nas articulações e músculos.

Existem diversos fatores laterais que acabam por impedir que se estabeleçam conclusões. Se compararmos um indivíduo a viver na Suécia, exposto a temperaturas extremas com um indivíduo que vive em Portugal, quem terá mais frio no inverno? Quem terá a casa mais adaptada para o frio? Quem terá melhor climatização no local de trabalho? Quem sentirá mais as oscilações de temperatura?

Mesmo na posse das respostas a todas estas questões, torna-se difícil estabelecer uma eventual correlação, porque é preciso acrescentar outros fatores externos, como as depressões ou a toma habitual de medicamentos, que podem ter influência na “sensação de dor”.

Se esta é a resposta da ciência e das evidências, como se explica a lógica do frio e a relação causa/efeito com a dor nas articulações? Há várias explicações e, se pararmos para pensar um pouco, são todas coerentes. Quando ficamos expostos ao frio ocorre uma resposta do nosso corpo que busca, a todo custo, manter o calor, mantendo o equilíbrio térmico.

Uma das formas de o corpo nos manter quentes é com a contração muscular, realizada de maneira involuntária pelo nosso sistema nervoso central. Essas contrações servem para aquecer o nosso corpo mas, às vezes, podem acabar por sobrecarregar algumas articulações. Imagine as dores resultantes da contração necessária para manter um peso de um quilo, sustentado de forma constante por um indivíduo na mão. Um quilo não pesa nada, mas se segurarmos um quilo durante 2 horas, ficando imóvel e sem movimentos, o resultado não será o esperado e esse mesmo quilo passa a “pesar” muito mais…

Outra explicação reside ainda na alteração da viscosidade do líquido sinovial (líquido “lubrificante” das nossas articulações) imposto pela temperatura, uma vez que sempre que diminui a temperatura, aumenta a viscosidade. Este facto pode implicar um aumento da rigidez articular.

Por fim, devemos ainda sinalizar uma reação fisiológica, perfeitamente normal, que é a contração da musculatura dos vasos sanguíneos (vasoconstrição), que acontece pela necessidade de diminuir a perda de calor pela pele. Esta reação inócua acaba por levar a um aumento da produção de ácido láctico, causador de cãibras e simultaneamente estimulador de aferências nervosas da dor.

Da próxima vez que lhe doerem os ossos, pense bem se deve ou não vaticinar uma previsão de mudança climática, porque o tempo pode não mudar… Mas, se tal acontecer, pode ser tão só uma coincidência.

Contudo, as dores musculares e de articulações são mesmo reais e não precisa ficar imóvel, à espera que o bom tempo decida voltar ou que os tremores e as reações ao frio acabem. O melhor mesmo é evitar este tipo de dor, recorrendo, por exemplo a agasalhos, de preferência leves para manter a temperatura corporal e aquecer o ambiente, sobretudo se tem uma atividade sedentária, que não implica grandes movimentos.

Mas, o mais importante de tudo e a terapia de eleição passa, necessariamente, pelo exercício físico, neste caso aeróbico. Esta é a nossa melhor sugestão para aumentar a temperatura corporal, até porque, simultaneamente, promove a vasodilatação, diminui o ácido láctico e aumenta as endorfinas (hormonas que diminuem a sensação de dor). Ou seja, andar, correr, nadar ou dançar são o melhor que podemos fazer para evitar as dores dos músculos ou articulações, independentemente da idade de cada um ou das previsões meteorológicas.

Pedro Marques (Médico Ortopedista)

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