A cicatrização do tecido ósseo é o fenómeno biológico que vai permitir a reconstrução de uma peça partida. O osso acaba por “colar” sozinho ou com a ajuda de materiais, como o titânio ou o aço inoxidável. Reposicionar as peças e alinhar os fragmentos acelera a recuperação e evitará futuras limitações
No teatro, pode dar sorte e por isso mesmo o voto expresso de “parte uma perna” a quem entra em cena. Fora do palco, ninguém quererá partir uma perna ou fraturar qualquer osso. A dor, a incapacidade e a limitação da função musculo-tendinosa desaconselham os votos expressos no teatro. Mas, quando tal acontece, há que apanhar os pedaços e tentar “colar” tudo. Como? Depende de cada caso, do tipo de fratura e da sua localização. Ou seja, as fraturas podem variar entre uma simples fissura num osso do pé, que não exige atuação e acaba por passar despercebida, a uma fratura pélvica grave, com risco de vida.
Por definição, uma fratura implica uma quebra na continuidade de um tecido vivo (o osso), seja por lesão ou por esforço excessivo. E quando a fratura rompe a barreira da pele, denomina-se fratura exposta, o que pode acontecer por traumatismo externo que rasga a pele e provoca a fratura ou porque o fragmento ósseo afiado rompe a pele. A consolidação ou a reposição da “normalidade” é um fenómeno biológico e basta proporcionar as melhores condições para que esse mesmo tecido se regenere em algumas semanas.
O osso pode fazer isso mesmo sozinho ou com alguma ajuda. É preciso ter presente que as fraturas não são todas iguais e, necessariamente, a reconstrução terá de se adaptar. O aço inoxidável ou o titânio podem ajudar na estabilização. Mas, nem sempre nem nunca. Recorre-se a este material de osteossíntese quando se exige um posicionamento local certo de todas as peças, como acontece num caso concreto de fratura numa articulação, mas também quando é necessário alinhar todos os fragmentos ósseos. Ou seja, quando é necessário proporcionar as melhores condições para que a consolidação óssea aconteça idealmente e sem risco de recaídas. Contudo, mais tarde ou mais cedo, este material terá de ser retirado, por fadiga do próprio metal. E, quando a fratura se apresenta consolidada e as cargas exercidas já são feitas pelo novo osso, o material deve ser retirado (sempre que possível).
O novo tecido ósseo começa a ser produzido logo nos primeiros dias a seguir à fratura, mas este tecido cicatricial, osso novo ou “calo”, é muito mole (tipo borracha), e ainda não tem cálcio na sua constituição, não possuindo por isso a força e densidade habituais e necessárias, podendo ser facilmente danificado. O processo de recuperação e de “colagem” só ficará concluído quando este mesmo tecido já tiver na sua constituição o cálcio, que se vai depositando no calo.
A rapidez ou o tempo de recuperação da fratura está também muito dependente da idade da pessoa, sendo certo que nas crianças a recuperação é mais rápida, mas a existência de algumas patologias, como a diabetes ou a doença arterial periférica podem atrasar todo o processo de cicatrização e a recuperação será sempre mais demorada.
A necessidade ou não de uma cirurgia também poderá ser equacionada, principalmente quando a fratura atinge uma articulação. Neste caso é imperioso que todos os fragmentos fiquem posicionados no seu local anatómico, caso contrário a mobilidade e a função normal dessa articulação pode ficar comprometida. Razão porque se recorre à cirurgia para que seja feito o reposicionamento correto de todos os fragmentos.
Se ainda não ficou muito convencido sobre este processo de auto recuperação do osso e do fenómeno biológico que se segue a uma fratura, sugerimos que esteja atento ao mundo animal. Certamente que já viu um cão a coxear e sem apoiar a pata no chão. Passado algum tempo, acaba por constatar que esse mesmo cão deixou de coxear e agora até corre e salta. Pois bem, o osso do cão “colou” e depois de um período de imobilidade, voltou tudo à normalidade.
Note bem, estes são os casos simples, porque também existem fraturas que lesionam outros tecidos, como vasos sanguíneos, nervos, músculos…
Pedro Marques
(Médico ortopedista)
Os meus agradecimentos ao Sr. Dr. Pedro Marques pela explicação clara e sucinta.
ReplyComo se continua a aprender, de um modo simples e inteligível, com os artigos publicitados na revista "Olhares". Continuem…
ReplyCarlos Vaz