Há uma receita ancestral que temos o dever de partilhar, porque isto de viver “à pressa” e de “comer qualquer coisa” são inimigos da saúde dos neurónios e de um funcionamento normal do cérebro. Partilhamos as evidências esquecidas

A alimentação constitui a fonte de nutrientes necessários para o bem-estar dos indivíduos, desde a sua conceção até à morte. A qualidade do padrão alimentar, mantido ao longo de todo o percurso de vida, é incontornavelmente determinante e preditiva da saúde de cada individuo, na plenitude do conceito.

O estilo de vida contemporâneo, caraterizado por elevados níveis de stress, associado ao sedentarismo e a uma alimentação desregrada, nutricionalmente pobre e monótona, constituem fatores de risco para inúmeras patologias, de entre as quais, também a demência. 

Neste contexto de vivência “à pressa”, ficam, cada vez mais frequentemente esquecidos, os conceitos, as preocupações e as práticas de autocuidado, simples, basilares e essenciais, com a alimentação enquanto fonte de energia, verdadeira aliada e agente de proteção e prevenção da saúde, ao abrigo de múltiplos argumentos despenalizadores da consciência, como a escassez de tempo, as exigências e limitações profissionais, sociais e familiares, entre tantos outros, e até, o próprio esquecimento! “como qualquer coisa” … Como se a plenitude da saúde fosse atingível com ”qualquer coisa”! 

Destas rotinas, expressa-se um padrão alimentar caraterizado por alimentos industrialmente processados, refeições pré confecionadas, rápidas, ricas em gorduras saturadas e açúcares e, simultaneamente, muito pobres em fibras, vitaminas e demais agentes antioxidantes. A adequada biodisponibilidade de nutrientes, importantes e necessários para a saúde dos neurónios e para a manutenção do normal funcionamento do cérebro, depende de um consistente e sistematizado padrão alimentar, equilibrado, saudável, diversificado e completo. 

A evidência científica é sugestiva de que os ácidos gordos ómega 3 e alguns outros micronutrientes, como as vitaminas do complexo B, as vitaminas E, C e D, representam efeitos benéficos sobre os neurónios, sobretudo no decurso do processo de envelhecimento. 

A deficiência de micronutrientes acentua o envelhecimento e a deterioração dos neurónios, potencializando o declínio da função cognitiva, concomitante ao avanço da idade. O stress oxidativo, as gorduras e as vitaminas relacionadas com a homocisteína, parecem ter relação com a patogénese da demência. A homocisteína é um aminoácido constituinte do plasma sanguíneo, que está amplamente correlacionado com a aterosclerose e, como tal, pode constituir fator de risco para a deterioração do processo cognitivo e para a demência. A concentração plasmática de homocisteína é determinante deste potencial risco, contudo, pode ser influenciada e controlada através das vitaminas do complexo B e do ácido fólico, passíveis de obter através de um padrão alimentar de qualidade. 

A carne, o peixe, os lacticínios, os ovos, as leguminosas secas, os cereais (trigo, centeio, cevada, arroz, aveia e milho), os produtos hortícolas, as frutas e os frutos oleaginosos, são alimentos ricos em vitaminas do complexo B. 

Folhas verdes versus alimentos processados

Os legumes de folha verde, a beringela, a beterraba, os brócolos, o alho francês, os espargos, a batata, os cereais, os frutos cítricos, os frutos oleaginosos, a carne (particularmente vaca, frango e pato), alguns peixes (carapau, dourada, peixe espada, pescada e sardinha), leguminosas (feijão, grão de bico, favas, ervilhas e lentilhas) e gema de ovo, constituem um amplo e diversificado leque de alimentos ricos em ácido fólico. 

Um padrão alimentar assente nos princípios da Dieta Mediterrânica, mantido de forma consistente e sistematizada, garante uma adequada e suficiente amplitude de alimentos, essenciais para assegurar a biodisponibilidade destes micronutrientes, com ação preventiva cientificamente evidenciada, no processo demencial.

O consumo excessivo de gorduras saturadas e hidrogenadas, presentes em alimentos processados e industrializados, refeições pré confecionadas, salgados (rissóis, croquetes, folhados e similares), enchidos, carnes gordas, produtos de charcutaria e lacticínios gordos, está amplamente associado ao aumento da insulinorresistência, do stress oxidativo e ao maior risco de declínio cognitivo. 

Em contrapartida, o baixo consumo de gorduras saturadas e hidrogenadas, associado a um consumo adequado e regular de ácidos gordos polinsaturados, sobretudo da série ómega 3 (sardinha, cavala, salmão, atum, óleos de peixe, nozes, sementes de linhaça e de chia, óleos vegetais, beldroegas, espinafres, couves, entre outros) estão diretamente correlacionados com a diminuição do risco de doenças cardiovasculares, e também do risco de desenvolver demência.

A mudança de estilo de vida, através da adoção de hábitos alimentares saudáveis, alicerçados nos princípios basilares da Dieta Mediterrânica, mantidos ao longo de todo o percurso de vida, expressa-se como a principal recomendação, no âmbito da relevância da alimentação para a prevenção do processo demencial. 

Primar por não “Esquecer” nem descurar os princípios básicos de uma alimentação saudável, equilibrada e diversificada, numa perspetiva dinâmica de autocuidado, poderá ser relevante na prevenção do risco do “Esquecimento” patológico.

Paulo Mendes
(Nutricionista) 

Deixar um Comentário