Pegou-se no abstrato para contar uma realidade concreta. O conceito pode ser filosófico e o primeiro olhar pode ter apenas um sentido figurativo, mas há muito mais por detrás de cada peça.

Vamos por partes. 

A peça principal deste conjunto escultório é um faco, o antigo equipamento que permitia realizar a cirurgia de catarata por facoemulsificação. Ou seja, o cirurgião trabalhava em ambiente fechado dentro do olho. E, ao mesmo tempo que se fragmentava o envelhecido cristalino, com recurso a ultrassons, também se aspiravam esses minúsculos fragmentos, por isso o termo facoemulsificação.

O saxofone foi ali colocado também de propósito e não foi para dar música a quem passa, mas sim em homenagem ao Prof. Charles Kelman que, em 1965, pegou na ideia do aparelho de ultrassom usado pelo seu dentista, para replicar o mesmo princípio na cirurgia de catarata. A aceitação da nova técnica não foi imediata e por isso a música e, em concreto o saxofone, seria a porta de escape para este cirurgião americano.

As antenas, que mais não são do que imitação de foguetes, são os festejos que os doentes fazem no pós-cirurgia da catarata, aquela que é definida como a “cirurgia milagre”, porque devolve mesmo toda a visão. A qualidade de vida aumenta e também por isso os frascos de perfume para homem e mulher, porque no final todos se sentem diferentes e de bem com a vida.

O patinho de borracha também tem um significado especial. Não só porque também existem cataratas congénitas, mas também porque a retinopatia de prematuridade foi aqui tratada pela primeira vez a nível mundial, a 27 de dezembro de 2005. As crianças tinham de estar presentes nesta alegoria e precisam de ter um lugar especial.

Ainda nem tudo ficou desvendado. É preciso perceber que um doente com catarata (ou com o cristalino disfuncional e envelhecido) entra aqui com a visão bastante embaciada e sem cor, por isso a presença da garrafa virada ao contrário, ou a embalagem de limpa vidros, porque ao início existe a ideia que o problema está nas lentes dos óculos e não nos olhos e por isso insistem em limpar e voltar a limpar as lentes.

A presença do pequeno comboio explica a estratégia de localização do Centro Cirúrgico de Coimbra, porque era preciso que esta unidade fosse acessível ao maior número de pessoas e por isso a existência de um apeadeiro de comboio (Espadaneira)- aqui mesmo ao lado – acabou por ser decisiva na opção por este terreno.

Por fim, o bule e as chávenas, a lembrar o chá das 5, porque é habitualmente a essa hora que a mudança começa a dar-se. É às 17h00 que os doentes, os cirurgiões, os anestesistas, enfermeiros e restante equipa técnica descem para o bloco operatório, para dar início à “cirurgia milagre” e outras.

Este arranjo escultório é da autoria do oftalmologista e cirurgião António Travassos. O apontamento da possível interpretação deste conjunto alegórico é da autoria de Conceição Abreu.

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