A tiroide é uma glândula fundamental na regulação do nosso metabolismo, anatomicamente localizada na área cervical. Porquê este título então? Os “olhos saídos” e a consequente “visão dupla” ou os olhos demasiado abertos, justificam esta relação entre olhos e tiroide

Algumas pessoas sofrem de uma patologia inflamatória autoimune em que existe produção de autoanticorpos dirigidos contra os recetores da TSH (thyroid-stimulating hormone), a hormona que estimula a tiroide. São estes anticorpos que, ao estimularem os fibroblastos dos tecidos da órbita, alteram as suas caraterísticas e dimensões. Pálpebras, gordura, tecido conjuntivo e, principalmente, os músculos, ficam congestionados e, posteriormente, fibróticos; obrigando, muitas vezes, o globo ocular, a ser empurrado para a frente quase saindo da órbita, por falta de outro caminho…

Esta é uma doença unilateral ou bilateral, que pode manifestar-se de diversas formas: exoftalmia (“olhos saídos”), diplopia (“visão dupla”), pálpebras edemaciadas e ruborizadas e olhos demasiado abertos, tão abertos que até custam a fechar.

Classicamente, estes sintomas associam-se a estados de hipertiroidismo, mas também podem surgir em casos de hipotiroidismo ou eutiroidismo. Na verdade, o aparecimento e evolução da doença orbitária não têm uma relação com o estado metabólico da glândula.

Sabe-se contudo que o tabagismo é um dos principais fatores de risco e portanto o abandono do tabaco é essencial e mandatório.

Numa fase aguda da doença, com franca atividade inflamatória, os tratamentos visam essencialmente diminuir a reação inflamatória e dirigir também o tratamento à própria glândula tiroideia. Os corticosteroides e os modernos tratamentos biológicos podem desempenhar nesta fase um papel fundamental.

Neste contexto, a intervenção do oftalmologista oculo plástico, além da intervenção médica sintomática, apenas se coloca do ponto de vista cirúrgico se a exoftalmia for refratária ao tratamento ou a compressão do nervo ótico for ameaçadora da visão.

Será na fase inativa da doença que se tratam as sequelas que, muitas vezes, são tão marcadas que alteram e desfiguram a face dos doentes, uma vez que a exposição exagerada da superfície ocular é evidente e incomodativa, além de predispor para a secura ocular e todas as suas consequências, a que se pode juntar a sensação de “pressão” na região orbitária, que é frequentemente descrita.

Habitualmente, o tratamento passa por conseguir ganhar espaço na órbita para que os tecidos se possam expandir e o olho possa recuar para a posição natural. É necessário descomprimir, ou seja, aumentar a órbita. Só depois deste passo importante é que podemos avançar para a correção, caso seja necessário, da diplopia (“imagem dupla”), uma situação que muitos doentes podem sentir devido ao complexo estrabismo restritivo, presente frequentemente.

Finalmente, a reabilitação palpebral. Estes doentes apresentam pálpebras descaídas, cheias de “bolsas” de gordura. Muitas vezes as pálpebras também podem apresentar-se retraídas, o que contribui para o fenótipo habitual destes casos. Torna-se por isso necessário proceder à sua correção. Esta não é uma cirurgia estética, mas sim reabilitadora e reconstrutiva, procurando devolver aos doentes aquilo que a doença lhes roubou, a sua aparência anterior, o conforto e até um pouco da sua identidade.

Rui Tavares
(Médico, Oftalmologista)

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